A Disfunção Temporomandibular (DTM) é uma condição clínica de natureza multifatorial que afeta a articulação temporomandibular (ATM), os músculos da mastigação e estruturas associadas. Sua etiologia é complexa e envolve a interação de diferentes fatores biomecânicos, neuromusculares, psicológicos, posturais e até sistêmicos [1].
1. Fatores Musculares
Grande parte dos casos de DTM tem origem miofascial, ou seja, relacionada a distúrbios nos músculos da mastigação [2]. O aumento da atividade muscular pode estar associado a episódios de sobrecarga funcional, como o bruxismo (ato de apertar ou ranger os dentes) [3], além de hábitos parafuncionais como morder objetos, roer unhas ou mascar chiclete de forma excessiva [4]. Essa hiperatividade muscular resulta em dor, fadiga e limitação funcional [5].
2. Alterações Articulares
Os distúrbios intra-articulares correspondem a alterações na posição ou no funcionamento do disco articular e das estruturas ósseas da ATM [6]. Entre os quadros mais comuns estão os deslocamentos do disco articular (com ou sem redução) [7], processos degenerativos como a artrose [8], além de inflamações articulares, como a artrite [9]. Esses problemas podem provocar estalidos, crepitações, bloqueios mandibulares e limitação de movimentos [10].
3. Fatores Psicológicos e Emocionais
O papel das condições psicológicas na gênese e manutenção da DTM tem sido amplamente reconhecido [11]. Fatores como estresse, ansiedade, depressão e outras alterações emocionais podem agravar ou até desencadear a sintomatologia dolorosa, aumentando a tensão muscular e perpetuando um ciclo de dor e disfunção [12]. A literatura também aponta para a relação entre a DTM e os transtornos do sono, especialmente os distúrbios de microdespertares [13].
4. Fatores Oclusais
Historicamente, a oclusão dentária foi considerada uma das principais causas de DTM. No entanto, estudos mais recentes demonstram que alterações oclusais, por si só, raramente são a causa primária da disfunção [14]. Ainda assim, discrepâncias oclusais significativas, contatos prematuros ou perda de suporte dentário podem atuar como fatores de risco ou agravantes, principalmente quando associados a outros elementos predisponentes [15].
5. Traumas
Traumas diretos sobre a região orofacial, como quedas, acidentes automobilísticos ou agressões, podem causar lesões na articulação temporomandibular e nos músculos adjacentes [16]. Além dos traumas diretos, movimentos bruscos do pescoço, como o “efeito chicote” (whiplash), também podem contribuir para o desenvolvimento de DTM [17].
6. Fatores Posturais
A relação entre a postura corporal, especialmente a posição da cabeça e do pescoço, e as disfunções temporomandibulares tem ganhado destaque nos últimos anos [18]. Alterações posturais, como a anteriorização da cabeça (cabeça projetada para frente), podem gerar desequilíbrios musculares que afetam diretamente o funcionamento da ATM [19].
7. Doenças Sistêmicas
Algumas doenças reumatológicas, como a artrite reumatoide, e condições clínicas como a fibromialgia, podem envolver a articulação temporomandibular como parte de um quadro sistêmico de dor crônica [20,21]. Nestes casos, o diagnóstico diferencial é fundamental para o manejo clínico adequado.
8. Fatores Genéticos e Predisponentes Individuais
Pesquisas recentes sugerem que a predisposição genética também pode ter um papel no desenvolvimento de DTM, influenciando tanto a resposta à dor quanto a estrutura e a função articular [22].
Considerações Finais
A DTM é uma condição de origem multifatorial e, na maioria dos casos, decorre da interação de dois ou mais fatores predisponentes, desencadeantes e perpetuantes. Por esse motivo, sua abordagem clínica exige uma avaliação individualizada e, muitas vezes, um manejo multidisciplinar, envolvendo profissionais de diferentes áreas, como odontologia, fisioterapia, psicologia e medicina [23].
O reconhecimento adequado das causas envolvidas é essencial para um diagnóstico preciso e para o desenvolvimento de um plano de tratamento eficaz e duradouro.
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